sexta-feira, 30 de novembro de 2012
quarta-feira, 28 de novembro de 2012
Dia que balança
E a vida balança... Embala, repara,
Vai, volta, cai, solta...Dança.
E a vida balança...Pesa,
junta, separa...Lança.
E a vida balanço...Pensa, "despensa", dispensa,
Avança, recua, estica, esmaga.
Trapézio de tempo,
Vento do salto.
Márcia Batista
sábado, 27 de outubro de 2012
Apanhador de Desperdícios
Uso a palavra para compor meus silêncios.
Não gosta das palavras
fatigadas de informar.
Não gosta das palavras
fatigadas de informar.
Dou mais respeito
às que vivem de barriga no chão
tipo água, pedra, sapo.
Entendo bem o sotaque das águas.
Dou respeito às coisas desimportantes e aos seres desimportantes.
Prezo insetos mais que aviões.
Prezo a velocidade
das tartarugas mais que a dos mísseis.
Tenho em mim esse atraso de nascença.
Eu fui aparelhado
para gostar de passarinhos.
Tenho abundância de ser feliz por isso.
Meu quintal é maior do que o mundo.
Sou um apanhador de desperdícios:
Amo os restos,
como as boas moscas.
Queria que a minha voz tivesse um formato de canto.
Porque eu não sou da informática:
eu sou da invencionática.
Só uso a palavra para compor meus silêncios.
Manoel de Barros
sábado, 29 de setembro de 2012
Espaço Curvo e Finito
Oculta consciência de não ser,
Ou de ser num estar que me transcende,
Numa rede de presenças
E ausências,
Numa fuga para o ponto de partida:
Um perto que é tão longe,
Um longe aqui.
Uma ânsia de estar e de temer
A semente que de ser se surpreende,
As pedras que repetem as cadências
Da onda sempre nova e repetida
Que neste espaço curvo vem de ti.
Ou de ser num estar que me transcende,
Numa rede de presenças
E ausências,
Numa fuga para o ponto de partida:
Um perto que é tão longe,
Um longe aqui.
Uma ânsia de estar e de temer
A semente que de ser se surpreende,
As pedras que repetem as cadências
Da onda sempre nova e repetida
Que neste espaço curvo vem de ti.
José Saramago
sábado, 22 de setembro de 2012
"Dentro da minha barriga mora um pássaro"
"Quantos seres sou eu para buscar sempre do outro ser que me habita as
realidades das contradições? Quantas alegrias e dores meu corpo se abrindo como
uma gigantesca couve-flor ofereceu ao outro ser que está secreto dentro de meu
eu? Dentro de minha barriga mora um pássaro, dentro do meu peito, um leão. Este
passeia pra lá e pra cá incessantemente. A ave grasna, esperneia e é
sacrificada. O ovo continua a envolvê-la, como mortalha, mas já é o começo do
outro pássaro que nasce imediatamente após a morte. Nem chega a haver intervalo.
É o festim da vida e da morte entrelaçadas."
Lygia Clark
sexta-feira, 7 de setembro de 2012
DESatando nóS
Quantos nós a morar em um, quanto tempo escorre pra desatar o enleio do desassossego? Como respirar neste encolher constante, neste trepidar de chão a cada passo, a cada espaço que se vai...
Quantos vacilos e solavancos aguenta a alma? Quantas almas é preciso pra aguentar um corpo? Quanto amor e fúria a andar irmanamente nestes descaminhos da gente, quantas febres a constituir o que somos...E o que somos?
Febres de ilhas em mar aberto, febres de luz em escuridões de desentendimentos, febres de dores, febre de amores, febres de cores neste monocromático existir,febres de ser, febres de ter...
Quantos nós a apertar a garganta, a selar relações, a cerrar idas e vindas, a crispar decisões, a desatinar orações, a coagular vidas...
Quanta falta no excesso de presenças e adoecimentos em solidões secretas.
Quanto de nós se esvai a cada hora, quando ausentes de si morremos em vida, desatamos em prantos, mas permanecemos em nó.
Márcia Batista
Mais Simples
É sobre-humano amar
'cê sabe muito bem
É sobre-humano amar, sentir,
Doer, gozar
Ser feliz
Vê quem sou eu quem te diz
Não fique triste assim
É soberano e está em ti querer até
Muito mais
A vida leva e traz
A vida faz e refaz
Será que quer achar
Sua expressão mais simples?
Mas deixa tudo e me chama
Eu gosto de te ter
Como se já não fosse a coisa mais humana
Esquecer
É sobre-humano viver
E como não seria
Sinto que fiz esta canção em parceria
Com você
A vida leva e traz
A vida faz e refaz
Será que quer achar'cê sabe muito bem
É sobre-humano amar, sentir,
Doer, gozar
Ser feliz
Vê quem sou eu quem te diz
Não fique triste assim
É soberano e está em ti querer até
Muito mais
A vida leva e traz
A vida faz e refaz
Será que quer achar
Sua expressão mais simples?
Mas deixa tudo e me chama
Eu gosto de te ter
Como se já não fosse a coisa mais humana
Esquecer
É sobre-humano viver
E como não seria
Sinto que fiz esta canção em parceria
Com você
A vida leva e traz
A vida faz e refaz
Sua expressão mais simples?
José Miguel Wisnick
terça-feira, 4 de setembro de 2012
Mas se tu me cativas...
Mas a raposa voltou à sua ideia.
Minha vida é monótona. Eu caço as galinhas e os homens me caçam. Todas
as galinhas se parecem e todos os homens se parecem também. E por isso
eu me aborreço um pouco. Mas se tu me cativas, minha vida será como que
cheia de sol. Conhecerei um barulho de passos que será diferente dos
outros. Os outros passos me fazem entrar debaixo da terra.
O teu me chamará para fora da toca, como se fosse música. E depois,
olha! Vês, lá longe, os campos de trigo? Eu não como pão. O trigo para
mim é inútil. Os campos de trigo não me lembram coisa alguma. E isso é
triste! Mas tu tens cabelos cor de ouro. Então será maravilhoso quando
me tiveres cativado. O trigo que é dourado, fará lembrar-me de ti. E eu
amarei o barulho do vento no trigo...
Antoine de Saint-Exupéry
Antoine de Saint-Exupéry
terça-feira, 21 de agosto de 2012
Extra Sísmico
Ando a não andar, a cismar meus dias em sístoles.
Sismos que fragmentam todo o ser que sou, dos órgãos à pele, da pele aos ossos.
A flertar abismos, a querer abismar-se.
De tão perto a duvidar não ser eu o próprio precipício.
Precipitada em ser além de mim, outra que acomode melhor a alma que trago comigo.
A cair, e ir, a desfalecer, e ser...
A morrer tantas vezes pra alargar a vida
Pra alagar a aridez de uma alma que se rememora líquida.
Márcia Batista
segunda-feira, 6 de agosto de 2012
Quase
Um pouco mais de sol - eu era brasa,
Um pouco mais de azul - eu era além.
Para atingir, faltou-me um golpe de asa...
Se ao menos eu permanecesse aquém...
Assombro ou paz? Em vão... Tudo esvaído
Um pouco mais de azul - eu era além.
Para atingir, faltou-me um golpe de asa...
Se ao menos eu permanecesse aquém...
Assombro ou paz? Em vão... Tudo esvaído
Num grande mar enganador de espuma;
E o grande sonho despertado em bruma,
O grande sonho - ó dor! - quase vivido...
Quase o amor, quase o triunfo e a chama,
Quase o princípio e o fim - quase a expansão...
Mas na minh'alma tudo se derrama...
Entanto nada foi só ilusão!
De tudo houve um começo ... e tudo errou...
- Ai a dor de ser - quase, dor sem fim...
Eu falhei-me entre os mais, falhei em mim,
Asa que se enlaçou mas não voou...
Momentos de alma que, desbaratei...
Templos aonde nunca pus um altar...
Rios que perdi sem os levar ao mar...
Ânsias que foram mas que não fixei...
Se me vagueio, encontro só indícios...
Ogivas para o sol - vejo-as cerradas;
E mãos de herói, sem fé, acobardadas,
Puseram grades sobre os precipícios...
Num ímpeto difuso de quebranto,
Tudo encetei e nada possuí...
Hoje, de mim, só resta o desencanto
Das coisas que beijei mas não vivi...
Um pouco mais de sol - e fora brasa,
Um pouco mais de azul - e fora além.
Para atingir faltou-me um golpe de asa...
Se ao menos eu permanecesse aquém...
Mário de Sá-Carneiro
segunda-feira, 30 de julho de 2012
Tempo (ral)
O tempo escorre da gente, e assim vai rindo do sonho humano de capturá-lo. Passa sem passar, fica sem pedir, não obedece relógios, seu senhor é o sentir. Congela e corta na saudade, voa no encontro, é sempre agora no amor, é longo e sem fim na dor, é cárcere na perda. O tempo corre da gente, não nos pertence, não somos do tempo contado, somos seres do tempo sentido. É ele que mostra a medida do mundo, o tamanho das almas, a força dos ventos. É ele que lambe as feridas, que arranca as vísceras, que deforma o olhar, que reforma o olhar. Armazém das horas, morada de amores, cores, dores e odores.
O tempo morre na gente, enterra palavras, desperta silêncios, embaralha a lógica do que foi, do que é e do que será. O tempo não se conjuga, não se guarda, não se dobra, é o dono absoluto das sombras e do sol. É ele o guardador de sementes, é nele que se adormece, é dele que se renasce, é por ele que se floresce.
Márcia Batista
Tu eras também uma pequena folha
Tu eras também uma pequena folha
que tremia no meu peito.
O vento da vida pôs-te ali.
A princípio não te vi: não soube
que ias comigo,
até que as tuas raízes
atravessaram o meu peito,
se uniram aos fios do meu sangue,
falaram pela minha boca,
floresceram comigo.
que tremia no meu peito.
O vento da vida pôs-te ali.
A princípio não te vi: não soube
que ias comigo,
até que as tuas raízes
atravessaram o meu peito,
se uniram aos fios do meu sangue,
falaram pela minha boca,
floresceram comigo.
Pablo Neruda
domingo, 29 de julho de 2012
Sobre dias lindos
Ouvir a afirmação "que dia lindo" sempre me gerou certa angústia. Um dia lindo é como uma intimação, destas levadas por oficial de justiça e tudo, para sair imediatamente de casa sem direito a bagagens ou telefonemas, e consumir o dia. Mas a questão é que nada parece ser suficiente diante da grandiosidade de um belo dia. Certa vez resolvi dividir esta agonia com uma amiga, daquelas que a gente confia as insanidades dos pensamentos. Para minha grata surpresa e absolvição ela também sentia igual, a terrível limitação de corresponder a um dia lindo, uma meliante a não cumprir a ordem de viver. Chegamos a uma conclusão engraçada, embora fora da lei: um dia lindo é merecedor de um streeptease, de um encontro com a própria pele, e assim correr nua pelas ruas, pelos campos, sem rumo, sem roupas, sem nada além da beleza da hora. Assim poderíamos nos fundir ao dia, sermos uma coisa só: terra, sol, corpo, vento, água e fogo. Este desejo atávico nos encontra vez ou outra, desempoeira nossos corpos domesticados e sacode nossa frágil infante civilidade. Percebe-se então o perigo de um dia lindo, é o toque de tambores que nos chama a transgredir as boas maneiras conquistadas e ser um tanto bicho, um tanto livre, um tanto chão, um tanto céu, um tanto Deus, um tanto nós.
Márcia Batista
quinta-feira, 26 de julho de 2012
Fridas
''Origem das duas Fridas. Recordação. Devia ter 6 anos quando vivi intensamente a amizade imaginária com uma menina de minha idade. (...) Não me lembro de sua imagem, nem de sua cor. Porém sei que era alegre e ria muito. Sem sons. Era ágil e dançava como se não tivesse nenhum peso. Eu a seguia em todos os seus movimentos e contava para ela, enquanto ela dançava, meus problemas secretos. Quais? Não me lembro. Porém ela sabia, por minha voz, de todas as minhas coisas...'' Diário de Kahlo, sobre a tela As Duas Fridas |
quarta-feira, 25 de julho de 2012
Viver...Vi - ver - ver - vi.
Márcia Batista
quinta-feira, 19 de julho de 2012
Reinvenção
"Para Nietzsche criar, mais do que um gesto individual, é um processo de
integração e participação na vida. A vida cria em suas constantes
transformações, em seu eterno jogo de vida e morte. Ao homem cabe dizer
sim ou não a este processo, isto o define como homem. Ao dizer sim ao
que os gregos chamavam de devir, o vir-a-ser constante das coisas, o
homem se vê inserido em um processo que necessariamente
leva à criação. Criar é suportar as contradições e intensidades da vida
no corpo, é transformar em signo este movimento excessivo que é viver.
Mas o rumo que nossa cultura ocidental tomou foi outro, ela separou e
opôs o bem e o mal, o corpo e alma, o acerto e o erro, o belo e feio.
Estimular a criatividade envolve, mais do que identificar gênios
criativos, reconstruir, reinventar os laços do homem com a vida."
Viviane Mosé
quarta-feira, 18 de julho de 2012
Tudo que não invento é falso
Eu não amava que botassem data na minha existência. A gente usava mais era encher o tempo. Nossa data
maior era o quando. O quando mandava em nós. A gente era o que quisesse ser só usando esse advérbio. Assim,
por exemplo: tem hora que eu sou quando uma árvore e podia apreciar melhor os passarinhos. Ou tem hora que
eu sou quando uma pedra. E sendo uma pedra eu posso conviver com os lagartos e os musgos. Assim: tem hora
eu sou quando um rio. E as garças me beijam e me abençoam. Essa era uma teoria que a gente inventava nas
tardes. Hoje eu estou quando infante. Eu resolvi voltar quando infante por um gosto de voltar. Como quem
aprecia de ir às origens de uma coisa ou de um ser. Então agora eu estou quando infante."
Manoel de Barros
A Palavra
Foto: Robert Doisneau
A palavra é uma roupa que a gente veste.
Uns usam palavras curtas. Outros usam roupa em excesso.
Existem, os que jogam palavra fora. Pior são os que usam em desalinho.
Uns usam palavras raras. Poucos ostentam palavras caras.
Tem quem nunca troca. Tem quem usa a dos outros.
A maioria não sabe o que veste. Alguns sabem e fingem que não.
E tem quem nunca usa a roupa certa pra ocasião.
Tem os que se ajeitam bem com poucas peças.
Outros se enrolam em um vocabulário de muitas.
Tem gente que estraga tudo que usa. E você?
A palavra é uma roupa que a gente veste.
Uns usam palavras curtas. Outros usam roupa em excesso.
Existem, os que jogam palavra fora. Pior são os que usam em desalinho.
Uns usam palavras raras. Poucos ostentam palavras caras.
Tem quem nunca troca. Tem quem usa a dos outros.
A maioria não sabe o que veste. Alguns sabem e fingem que não.
E tem quem nunca usa a roupa certa pra ocasião.
Tem os que se ajeitam bem com poucas peças.
Outros se enrolam em um vocabulário de muitas.
Tem gente que estraga tudo que usa. E você?
Com quais palavras você se despe?
Viviane Mosé
domingo, 15 de julho de 2012
sábado, 14 de julho de 2012
Les Feuilles Mortes
Oh ! je voudrais tant que tu te souviennes
Des jours heureux où nous étions amis.
En ce temps-là la vie était plus belle,
Et le soleil plus brûlant qu'aujourd'hui.
Les feuilles mortes se ramassent à la pelle.
Tu vois, je n'ai pas oublié...
Les feuilles mortes se ramassent à la pelle,
Les souvenirs et les regrets aussi
Et le vent du nord les emporte
Dans la nuit froide de l'oubli.
Tu vois, je n'ai pas oublié
La chanson que tu me chantais.
Des jours heureux où nous étions amis.
En ce temps-là la vie était plus belle,
Et le soleil plus brûlant qu'aujourd'hui.
Les feuilles mortes se ramassent à la pelle.
Tu vois, je n'ai pas oublié...
Les feuilles mortes se ramassent à la pelle,
Les souvenirs et les regrets aussi
Et le vent du nord les emporte
Dans la nuit froide de l'oubli.
Tu vois, je n'ai pas oublié
La chanson que tu me chantais.
C'est une chanson qui nous ressemble.
Toi, tu m'aimais et je t'aimais
Et nous vivions tous deux ensemble,
Toi qui m'aimais, moi qui t'aimais.
Mais la vie sépare ceux qui s'aiment,
Tout doucement, sans faire de bruit
Et la mer efface sur le sable
Les pas des amants désunis.
Les feuilles mortes se ramassent à la pelle,
Les souvenirs et les regrets aussi
Mais mon amour silencieux et fidèle
Sourit toujours et remercie la vie.
Je t'aimais tant, tu étais si jolie.
Comment veux-tu que je t'oublie ?
En ce temps-là, la vie était plus belle
Et le soleil plus brûlant qu'aujourd'hui.
Tu étais ma plus douce amie
Mais je n'ai que faire des regrets
Et la chanson que tu chantais,
Toujours, toujours je l'entendrai !
Les souvenirs et les regrets aussi
Mais mon amour silencieux et fidèle
Sourit toujours et remercie la vie.
Je t'aimais tant, tu étais si jolie.
Comment veux-tu que je t'oublie ?
En ce temps-là, la vie était plus belle
Et le soleil plus brûlant qu'aujourd'hui.
Tu étais ma plus douce amie
Mais je n'ai que faire des regrets
Et la chanson que tu chantais,
Toujours, toujours je l'entendrai !
Desintegração
Fico tão assustada quando percebo que durante horas perdi minha formação
humana. Não sei se terei uma outra para substituir a perdida. Sei que
precisarei tomar cuidado para não usar superficialmente uma nova
terceira perna que em mim renasce fácil como capim, e a essa perna
protetora chamar de uma verdade Mas é que também não sei que forma dar
ao que me aconteceu. E sem dar uma forma, nada me existe. E - e se a
realidade é mesmo que nada existiu?! Quem sabe nada me aconteceu? Só
posso compreender o que me acontece mas só acontece o que eu compreendo -
que sei do resto? O resto não existiu. Quem sabe nada existiu! Quem
sabe me aconteceu apenas uma lenta e grande dissolução? E que minha luta
contra essa desintegração está sendo esta: a de tentar agora dar-lhe
uma forma? Uma forma contorna o caos, uma forma dá construção à
substância amorfa - a visão de uma carne infinita é a visão dos loucos,
mas se eu cortar a carne em pedaços e distribuí-los pelos dias e pelas
fomes - então ela não será mais a perdição e a loucura: será de novo a
vida humanizada.
A vida humanizada. Eu havia humanizado demais a vida.
A vida humanizada. Eu havia humanizado demais a vida.
Clarice Lispector - A Paixão segundo G.H
Leonel Pé-de-Vento
Belo, sensível e criativo.
Curta-metragem em animação, 15 minutos, 2006. Direção de Jair Giacomini
quarta-feira, 11 de julho de 2012
Fotografrar ou ressignificar...
"Revelações nascem do escuro
em varais de espera, em merguhos.
Tempos depois
luzes acendem imagens,
curas."
em varais de espera, em merguhos.
Tempos depois
luzes acendem imagens,
curas."
Além do Bem e do Mal
(Salvador Dali)
Nossas mentes rechaçam a idéia do nascimento de uma coisa
que pode nascer de uma contrária, por exemplo: a verdade do
erro; a vontade do verdadeiro da vontade do erro; o ato
desinteressado do egoísmo ou a contemplação pura do sábio, da
que pode nascer de uma contrária, por exemplo: a verdade do
erro; a vontade do verdadeiro da vontade do erro; o ato
desinteressado do egoísmo ou a contemplação pura do sábio, da
cobiça. Tal origem parece impossível: pensar nisso parece
próprio de loucos. As realidades mais sublimes devem ter outro
origem, que lhes seja peculiar. Não pode ser sua mãe esse
mundo efêmero, falaz, ilusório e miserável, esta emaranhada,
cadeia de ilusões, desejos e frustrações. No seio do ser, no qual
não morrerá nunca, num deus oculto, na “coisa em si” é onde
deve se lobrigar seu princípio, ali e em nenhuma outra parte.
origem, que lhes seja peculiar. Não pode ser sua mãe esse
mundo efêmero, falaz, ilusório e miserável, esta emaranhada,
cadeia de ilusões, desejos e frustrações. No seio do ser, no qual
não morrerá nunca, num deus oculto, na “coisa em si” é onde
deve se lobrigar seu princípio, ali e em nenhuma outra parte.
Nietzsche - Além do Bem e do Mal
Por uma alameda do zoológico
Ela também chegará
Ela que também amava os animais
Entrará sorridente assim como está
Na foto sobre a mesa
Ela é tão bonita
Ela é tão bonita que na certa
eles a ressuscitarão
O século 30 vencerá
O coração destroçado já
Pelas mesquinharias
Agora vamos alcançar
Tudo que não podemos amar na vida
Com o estrelar das noites inumeráveis
Ressuscita-me
Ainda que mais não seja
Porque sou poeta e ansiava o futuro
Ressuscita-me
Lutando contra as misérias do cotidiano
Ressuscita-me por isso
Ressuscita-me
Quero acabar de viver o que me cabe
Minha vida
Para que não mais exista amores servis
Ressuscita-me
Para que ninguém mais tenha
De sacrificar-se por uma casa ou um buraco
Ressuscita-me
Para que a partir de hoje
A partir de hoje
A família se transforme
E o pai
Seja, pelo menos, o universo
E a mãe
Seja, no mínimo, a terra
A terra, a terra
Mayakovsk
"Todo homem é comum mesmo não sendo. O não ser comum do homem parece
estar em sua forma própria de ser comum. Em seu jeito singular de
sofrer, brincar, envelhecer. Em sua necessidade de construir,
simbolizar, criar. Um homem não deixa de ser comum mesmo entre letras,
livros, máquinas, sistemas, signos. Um homem é sempre uma trajetória que
declina. Que ascende, mas que declina. O comum do homem é sua
aparição relâmpago, o seu constituir e o seu perecer. O comum do homem é
sua necessidade de dizer, manifestar, inscrever, perpetuar. Ao mesmo
tempo sua impossibilidade de permanecer. Todo homem constitui-se na
tensão entre viver e morrer, entre dizer e calar, entre subir e descer.
Mas, por razões extensas e difíceis, a história humana parece ter se
ordenado em torno da vontade de não ser.
Não envelhecer, não sentir dor, não se cansar, não se aborrecer. O homem parece envergonhar-se de ser: pequeno, sensível, mortal, humano. E organiza-se em torno de um ideal de homem, sem corpo. O homem envergonha-se de seu corpo. Não de seu sexo ou de seu prazer, mas de suas vísceras, de seus excrementos, de seus sons e odores, de seu processo bioquímico, fisiológico, orgânico. O homem envergonha-se de morrer e vai acuando-se, escondendo-se, perdendo-se em torno de uma idéia, de uma imagem. Em sua luta por não ser comum, o homem tornou-se nenhum. Todo homem virou nenhum. Nenhum homem na rua, em casa. Nenhum homem na cama. Nenhum homem, mas um nome. O homem se reduziu a um nome. Não um nome próprio, mas um substantivo".
Não envelhecer, não sentir dor, não se cansar, não se aborrecer. O homem parece envergonhar-se de ser: pequeno, sensível, mortal, humano. E organiza-se em torno de um ideal de homem, sem corpo. O homem envergonha-se de seu corpo. Não de seu sexo ou de seu prazer, mas de suas vísceras, de seus excrementos, de seus sons e odores, de seu processo bioquímico, fisiológico, orgânico. O homem envergonha-se de morrer e vai acuando-se, escondendo-se, perdendo-se em torno de uma idéia, de uma imagem. Em sua luta por não ser comum, o homem tornou-se nenhum. Todo homem virou nenhum. Nenhum homem na rua, em casa. Nenhum homem na cama. Nenhum homem, mas um nome. O homem se reduziu a um nome. Não um nome próprio, mas um substantivo".
Viviane Mosé
sexta-feira, 6 de julho de 2012
Seu Lugar
Carrego seu coração comigo
Eu o carrego no meu coraçãoNunca estou sem ele
Onde eu for, você vai, minha querida
Não temo o destino
Você é meu destino, meu doce
Não quero o mundo pois, beleza
Você é meu mundo, minha verdade
Eis o segredo que ninguem sabe
Aqui está a raiz da raiz
O broto do broto
E o céu do céu
De uma arvore chamada vida
Que cresce mais do que a alma pode esperar
Ou a mente pode esconder
E esse é o prodigio
Que mantem as estrelas a distancia
Carrego seu coraçao comigo
Eu o carrego no meu coraçao.
E.E. Cummings
segunda-feira, 2 de julho de 2012
"Olhe para todos ao seu redor e
veja o que temos feito de nós. Não temos amado acima de todas as
coisas. Não temos aceito o que não entendemos porque não queremos passar
por tolos. Temos amontoado coisas e seguranças por não termos um ao
outro. Não temos nenhuma alegria que já não esteja catalogada. Não nos
temos entregues a nós mesmos, pois isso seria o começo de uma vida larga
e nós a tememos. temos evitado cair de joelhosn diante do primeiro de
nós que por amor diga: tens medo. Temos procurado nos salvar, mas sem
usar a palavra salvação para não envergonharmos de ser inocentes. Não
temos usado a palavra amor para não termos de reconhecer sua contextura
de ódio, de ciúmes e de tantos outros contraditórios. Temos mantido em
segredo a nossa morte para tornar nossa vida possível. Temos disfarçado
com falso amor nossa indiferença, sabendo que nossa indiferença é
angústia disfarçada. Temos disfarçado com pequeno medo o grande medo
maior e por isso nunca falamos o que realmente importa. Falar no que
realmente importa é considerado uma gafe. Não temos adorado por termos a
sensata mesquinhez de nos lembrarmos a tempo dos falsos deuses. Não
temos sido puros e ingênuos para não rirmos de nós mesmos, e para que no
fim do dia possamos dizer "pelo menos não fui tolo" e assim não
ficarmos perplexos antes de apagar a luz. Temos sorrido em público o que
não sorriríamos quando ficássemos sozinhos. Temos chamado de fraqueza a
nossa candura. Temo-nos temido um ao outro, acima de tudo. E a tudo
isso consideramos a vitória nossa de cada dia."
Clarice Lispector
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